Infância esquecida (Infância – 3)
No fim de uma tarde tão bem passada, com os seus meninos – entre risadas, um ou outro ralhete e dezenas de abraços e beijocas –, era tempo de dar continuidade às arrumações de primavera. As roupas que se iam soltando das molas cheiravam a limpo, mas também a doces memórias, dos tempos em que o seu pequeno era mesmo pequeno (tanto aos olhos da sua mãe como aos do resto do mundo). Era tempo de as passar para o novo pequeno ser que crescia na casa.
Com uma voz demasiado entaramelada para o seu gosto, exteriorizou:
- Ainda me lembro, como se fosse hoje, de te ver vestido com estas roupas, filho!
- Mostra, mãe – virou-se o rapaz interessado. E retorquiu, com um sorriso: - Eu não me lembro nada destas roupas!
Aquele comentário atingiu-a como um raio. O seu menino, que se lembra sempre dos percursos de automóvel, dos filmes e dos livros, de lugares e de sons, pr’aí desde os seus… 4 anos… Aquela roupa era de quando ele tinha apenas 2…
E o que é feito dessas memórias? Que tristeza, pensou ela com uma ponta de amargura. A primeira infância está definida pelos especialistas como o período da vida que compreende o 1º dia até ao 6º ano da vida. E, no entanto, dessa 1ª fase apenas se guarda uma ínfima parte de recordações.
E, olhando para a sua princesita, 2 anitos quase completos, refletiu que ela, tal como o mano, nunca se iria lembrar das… (parecem mil, mas é um exagero) muitas vezes que engoliu o jantar a correr para garantir que a deitava a horas, das (sim, aqui os números são mais exatos) quase 100 semanas de noites passadas num vaivém entre quartos - ora para pôr a chupeta, ora para dar de mamar… - das centenas de xixis que a obrigaram a trocar fraldas, pijamas e às vezes camas (ainda hoje!).
Sobretudo, os seus 2 tesouros não se iriam nunca lembrar de que a mãe nunca deixava de lhes dar banho, aconchegar os lençóis ou contar uma história, mesmo que por vezes alguma dor ou o extremo cansaço prometessem não a deixar cumprir a tarefa.
“Mas, autovitimização à parte, a natureza errou aqui” – pensou ela, um pouco mais (?) racional.
A melhor época da vida, em que tudo nos é perdoado, em que (quase) tudo nos é permitido, em que se passa o tempo a dormir, brincar e a descobrir o mundo, e nada de nos lembrarmos disso! A 1ª infância deveria ser um prémio que todos recebêssemos no final da vida: os melhores anos antes do fim. Teria é de se lhe mudar o nome, para última infância, talvez?
Ou, melhor ainda! Que tal se todos nós tivéssemos o direito de voltar a essa infância, sei lá, uma vez por mês? Chupeta, Cerelac, beber leitinho na cama, colo, muito colo a qualquer ora do dia (ou da madrugada…), construir torres em legos, ouvir histórias, ter pessoas a bater-nos palmas e a rir das nossas graças e a fazer-nos sentir o centro do mundo!...
Ai, saudades dessa infância de que não me lembro!
Sandrapep