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Mil Razões...

O quotidiano e a nossa saúde emocional e mental.

O quotidiano e a nossa saúde emocional e mental.

31
Jul12

A saúde mental dos portugueses (Saúde mental – 9)

Publicado por Mil Razões...

 

É cada vez mais frequente ouvirmos falar, por aí, em saúde mental. Não sei se o termo simplesmente se banalizou, ou se, efetivamente, se generalizou uma preocupação legítima com esta problemática!

Mas o que é, então, a saúde mental? E como andará a saúde mental dos portugueses?

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), saúde mental define-se como “o estado de bem estar, no qual cada individuo tem conhecimento total do seu próprio potencial, consegue lidar com o stress normal da vida, consegue trabalhar produtivamente e com resultados e ser capaz de fazer uma contribuição para a sua comunidade”.

Então, ao falarmos em saúde mental, queremos referir a ausência de doença mental, ou inexistência de psicopatologia, ou seja, um estado de saúde normal. Contudo, por si só, a ausência de sintomas psiquiátricos como a falta de resiliência ou da adequada capacidade mental, a depressão, ou as dependências de substâncias, por exemplo, não são suficientes para afirmarmos que a pessoa seja possuidora de robustez mental. A pessoa com saúde mental deverá apresentar capacidades e recursos próprios para lidar com as diversas situações com que se depara no seu dia a dia, não adoecendo. Esta pessoa deverá ter uma boa capacidade de adaptação e de se relacionar afetivamente com os outros. E, assim, sentir-se bem e feliz.

Alguns estudos epidemiológicos demonstraram que as perturbações psiquiátricas e os problemas de saúde mental se tornaram numa das principais causas de incapacidade e morbilidade nas sociedades atuais.

Estima-se que Portugal seja o país da Europa com maior prevalência de doenças mentais, sendo que um em cada cinco portugueses já tenha sofrido de uma doença psiquiátrica e, quase metade, já tenha sido vítima de uma dessas perturbações ao longo da vida.

A problemática associada à saúde mental reside no facto de mais de metade dos doentes graves se encontram sozinhos com o seu problema, sem nunca terem tido, ou procurado, qualquer tipo de ajuda e tratamento.

A boa saúde mental depende fortemente do estado geral biológico e cerebral, pois a saúde mental e a saúde física são duas vertentes fundamentais e indissociáveis da saúde, pelo que, por vezes, será importante o recurso a tratamentos com fármacos existentes para recuperar, ou até mesmo, para manter a boa saúde mental. E, estes tratamentos combinados com outras intervenções terapêuticas (psiquiátricas e psicológicas, por exemplo) promovem a referida melhoria e manutenção da saúde mental.

 

Andreia Esteves-Pinto (articulista convidada)


27
Jul12

Com muito amor (Saúde mental – 8)

Publicado por Mil Razões...


Sentada num dos bancos do jardim, tinha os cotovelos apoiados nos joelhos unidos e firmes. A cabeça pousada nas mãos. Na esquerda, entre o indicador e o médio esticados e amarelecidos pelo fumo, ardia mais um cigarro. Ali junto aos cabelos. Esquecido. A passarada nas copas altas, embalada pela suave brisa, soltava cânticos de final de tarde. Os carros na estrada junto aos muros do hospital, embalados pela indiferença, soltavam ruídos de regresso a casa. Poderia pensar-se que Carolina observava a fila de formigas diante dos seus pés. Mas não. Os olhos fixavam-se apenas para dentro. E nada viam para além do vazio. Grande, espesso e negro. Não conseguia pensar. Não conseguia ouvir. Não conseguia falar. Não conseguia sentir. Há poucos dias não conseguia controlar as sensações, nem os pensamentos, eram tantos, eram tão confusos, ligavam-se uns nos outros, sem parar, provocavam sofrimento, não conseguia parar aquela dor.


Duas vozes ao seu lado. Conversavam. Não ouvia o que diziam.

- Mais uma crise. Cada uma é pior, mais profunda do que a anterior.

- Desta vez, como foi?

- Como as outras. Exatamente como as outras. Depois do internamento começa a recuperar, a ter uma vida normal, a sentir-se melhor consigo mesma. As consultas com o psiquiatra ficam mais espaçadas e a medicação é reduzida. Depois, por uma razão qualquer, começa a dizer que a medicação a faz sentir-se mal, que a impede de ser tal como é, e começa a regular a medicação por sua iniciativa – toma o que quer, quando quer e na quantidade que quer. Como não tem quem a controle, quem lhe imponha limites e regras, fica entregue a si mesma. Daí passa a não ter regras nem rotinas diárias, dorme muito pouco e quando entende, come quase nada e quando calha, aumenta a quantidade de cigarros. Sente-se alvo de todos, ataca todos. Tudo nela acelera: o discurso, o pensamento, os movimentos do corpo. Discorre sobre tudo, com tal acutilância e a tal velocidade, que parece uma máquina. Fica irónica, agressiva e violenta. É difícil estar ao pé dela. É insuportável viver com ela – um tormento, um desassossego.

- Começa a faltar-lhe o juízo…

- E o amor. Sente-se sozinha, abandonada, desamada. E parece odiar todos, odiar tudo. Exprime imensa revolta.

- E o médico?

- Recusa ir ao psiquiatra. Recusa tudo. Diz que ela é que sabe o que é melhor para si mesma. E agora, nas crises mais recentes, tem pavor de voltar a ser internada e vê o médico como um angariador de internamentos, por isso foge dele. Ou seja, coloca-se na posição ideal para ser internada. É um enorme sofrimento.

- E é o que acaba por acontecer…

- É o que acaba por acontecer, mas à força, quando fica sem qualquer controlo sobre si mesma, quando se torna socialmente insuportável, quando se constitui num perigo para os outros e para si mesma. Completamente fora… Quando vem para aqui, à força, o seu sofrimento ainda aumenta mais. Ficar fechada, ser controlada, tomar medicação imposta… é terrível.

- Mas é o melhor para ela.

- É! Depois fica assim, calma mas com total ausência, como se já nada existisse dentro dela.

- Precisa de quem cuide dela. E com muito carinho.

- Sim, e com muito amor.

 

Fernando Couto


24
Jul12

Três pontos para reflexão (Saúde mental - 7)

Publicado por Mil Razões...

 

1. LEGISLAÇÃO PORTUGUESA

 

a)

A publicação do Decreto-Lei n.º 8/2010, de 28 de janeiro, institui a última vertente estrutural do Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 49/2008, de 6 de março, sendo simultaneamente alargada a rede nacional de cuidados continuados integrados (RNCCI).

 

b)

A Portaria n.º 149/2011, de 8 de abril, estabelece a coordenação nacional, regional e local das unidades e equipas prestadoras de cuidados continuados integrados de saúde mental, bem como as condições de organização e o funcionamento das unidades e equipas prestadoras e cuidados continuados integrados de saúde mental para a população adulta e para a infância e adolescência.

 

c)

“A criação dos Cuidados Continuados Integrados de Saúde Mental (CCISM) permitiu que a RNCCI se estendesse a pessoas com problemas de saúde mental ao contemplar a existência de estruturas reabilitativas psicossociais, nomeadamente equipas de apoio domiciliário, unidades sócio-ocupacionais e unidades residenciais, respondendo a situações com vários graus de incapacidade psicossocial e dependência decorrentes de doença mental grave. De forma inovadora são também concebidas tipologias para crianças e adolescentes, direccionadas para uma intervenção reabilitativa junto de situações nesta faixa etária em cujo défice decorrente da doença mental ou da perturbação grave do desenvolvimento e estruturação da personalidade limita a funcionalidade psicossocial. A Resolução do Conselho de Ministros n.º 37/2010, de 14 de maio, veio estabelecer as atribuições em matéria de respostas de cuidados continuados integrados de saúde mental que são cometidas à Unidade de Missão para os Cuidados Continuados Integrados (UMCCI), as quais são desenvolvidas por uma equipa de projeto exclusivamente encarregue da prossecução das incumbências inerentes a estas novas atribuições da UMCCI.”

(http://www.saudemental.pt/219-2/)

 

d)

A Circular Normativa n.º 37/2011, de 28 de dezembro, da Administração Central do Sistema de Saúde, regulamenta a dispensa de pagamento de taxas moderadoras de consultas, sessões de hospital de dia, bem como de atos complementares prescritos no decurso destas, no âmbito da saúde mental.

 

 

2. PARTICIPAÇÃO E INVESTIGAÇÃO

 

a)

A equipa de projeto de cuidados continuados integrados de saúde mental, referida em 1. c), já produziu dois relatórios de actividades (2010 e 2011), que podem ser consultados em:

(http://www.saudemental.pt/wp-content/uploads/2012/06/RELATÓRIO-ACTIVIDADES-2010.pdf)

(http://www.saudemental.pt/wp-content/uploads/2012/06/RELATÓRIO-ACTIVIDADES-2011.pdf)

 

b)

“Foi recentemente aprovada pelos Estados-Membros da União Europeia, a liderança de Portugal na candidatura à Ação Conjunta (Joint Action) de 2012 na área da Saúde Mental. A par da liderança da Ação Conjunta, Portugal apresentou a proposta para liderar um dos grupos de trabalho que abordará o tema associado à Inclusão Social das pessoas com doença mental, alinhado com os princípios definidos no Plano Nacional para a Saúde Mental 2007-2016, aprovado em Resolução de Conselho de Ministros.”

(http://www.saudemental.pt/eventos-cientificos/lideranca-de-portugal-na-candidatura-a-accao-conjunta-europeia-de-2012-sobre-saude-mental/)

 

 

3. REALIDADE

 

a)

“O Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa revelou hoje que os doentes esperam em média perto de dois meses por uma consulta, um período que "cumpre integralmente a definição dos tempos máximos de resposta garantidos”. (…) O CHPL sublinha ainda que o "Regulamento do Sistema Integrado de Referenciação e de Gestão do Acesso à primeira consulta de especialidade hospitalar define tempos de resposta de 30 dias se a realização da consulta for considerada muito prioritária, 60 dias se prioritária e 150 dias se for considerada normal".

(http://www.ionline.pt/portugal/doentes-psiquiatria-esperam-cerca-dois-meses-consulta)

 

b)

O número de pedidos para consultas cresce e o serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar do Oeste Norte (CHON) continua com poucos recursos. A lista de espera tem aumentado e o tempo de espera para uma consulta é maior”.

(http://www.jornaldascaldas.com/JournalNews/Journalnewsdetail.aspx?news=1b11b0bb-8343-4559-bd7d-52eeae0e8800&q=PS)

 

c)

Tempo de espera para uma primeira consulta de Psiquiatria no Centro Hospitalar do Porto: 22 dias. Tempo de espera para Psiquiatria da infância e adolescência: 27 dias.

(http://www.chporto.pt/ver.php?cod=0C0E)

 

d)

“O presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental, António Palha, denuncia que o apoio aos doentes mentais junto das suas famílias ou perto de casa praticamente não existe ou é muito escasso. Esta situação foi agravada pelo fecho ou redução dos antigos hospitais psiquiátricos nos últimos dez anos. O problema é que, antes de fechar, deveria ter sido criada uma rede de cuidados continuados, observa António Palha. O presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental afirma que a lei de saúde mental pode ser uma bela ideia, mas não passa de papéis escritos para os doentes e para as famílias.

(http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=554860&tm=2&layout=123&visual=61)

 

Rui Duarte

 

20
Jul12

Saúde a granel (Saúde mental - 6)

Publicado por Mil Razões...

 

Numa manhã de nevoeiro José saiu à rua e viu tudo mais claro do que nunca. Quando acordou nesse dia, vestiu-se ao acaso, mexeu-se mecanicamente, abriu a janela sem ver nada nem ninguém. A mesma rotina dos últimos dois anos. Fechou a porta sem saber para onde ir, sem vontade de chegar a nenhum destino. A quietude que parecia anteceder o grito não o deixava respirar. Sentia-se num crescendo lento e doloroso. Já tinha partilhado, com um ou outro amigo, esse seu estado de alma que o trazia cada vez mais apático e desistente. A crise, a crise, e só se falava da crise. José pensava “também eu estou em crise…”. “Não Zé, não é essa crise, a da tua cabeça… É a crise a sério: a da falta de pilim, de trabalho, de dignidade. Depressão, que é isso? Tanta coisa séria a acontecer e tu empancas no caraças da depressão? Sai lá disso, Zé, e deixa-te de lamúrias.” Ah, essa crise, afinal, é que é crise, pensou. O resto são amendoins de segunda. Como raio se enfrenta uma crise sem cabeça? Como raio descuramos a saúde mental em prol do vil metal? Ouvia constantemente: “Quem trabalhará por mim se eu adoecer? Quem me pagará as contas, quem alimentará os meus filhos se eu ficar chalupa? “ José conclui que, pelo menos em Portugal, a saúde mental anda pela horinha da morte. Tal e qual. Um tipo pode ter amantes, pode protagonizar cenas de pancadaria, pode entregar a casa ao banco quando já não a consegue pagar, pode fazer mil e uma asneiras. Pode queixar-se continuamente da crise, da corrupção, da atitude passiva de uma nação. Pode cuspir para o chão, coçar as partes despudoradamente como se vivesse sozinho no mundo, pode vociferar, partir uma perna, ter uma cãibra violenta, uma infeção qualquer. Tudo. Um tipo pode fazer quase tudo. Pode ser tudo menos depressivo e frágil. É “mariquinhas”, é “isso não é cena de gajo”, é “abichanado”, é tanta coisa que José deixou de se queixar. Passou a guardar para si o sofrimento, até este já não lhe caber dentro do peito. Pediu ajuda, procurou consulta médica. Nas horas que passou à espera, só para essa marcação, imaginou mil maneiras de se matar, com requintes de malvadez. Quanto mais pensava nisso mais certa a ideia lhe parecia. Nada, absolutamente nada, jogava a seu favor: marcação de consulta no público com semanas de tempo de espera, consultas no privado pelas quais lhe pediam couro e cabelo, sentia-se no epicentro de uma crise de meia-idade, havia perdido a companheira de uma vida inteira. Estava vazio. Perdido. Tão oco que um simples gemido o fazia saltar da cadeira. Em tempos, havia genuinamente gostado das pessoas. Achava-as mais humanas, mais presentes. Tinha vivido rodeado de gente até ao dia em que se atreveu a dizer que se sentia deprimido. Desse dia em diante, a maior parte das pessoas havia partido, fechadas no mutismo de quem não entende, embotando sentimentos e afetos. Partiram. Da noite para o dia. Falar em depressão, atualmente, parece surtir o efeito da lepra na idade média: quem não morre, põe-se a milhas. José deambula ao acaso, esperando que o sol dissipe a nuvem que com ele caminha. Quando encontra o rosto de alguém, poucos olhares lhe são devolvidos. As pessoas não se olham, não se tocam. Uma ervilha a menos no mundo não faz sequer mossa, pensou. Nessa manhã de nevoeiro sentiu o sol dissipar a nuvem. Pela primeira vez em muito tempo não lhe custou inspirar. Fechou os olhos, sorriu e abriu os braços ao mundo. Não podia haver dia mais bonito para respirar pela última vez.

 

Alexandra Vaz

 

17
Jul12

Cenário de exaustão! (Saúde Mental - 5)

Publicado por Mil Razões...

 

 

A Saúde Mental em Portugal está, decididamente, doente! Sendo esta parte integrante de todos nós, e indissociável do contexto em que vivemos, não existem atualmente condições para que a Saúde Mental consiga manter-se em equilíbrio. A rutura a que muitas famílias e seus membros chegaram tem consequências adversas na sua capacidade de resposta face aos desafios atuais. Sendo Saúde Mental um conceito lato, que não se restringe apenas a avaliações psiquiátricas, pode sentir-se no dia-a-dia, que a Saúde Mental, não só dos indivíduos como das famílias, empresas, sociedade, país, está perturbada.

A crise mental em que imergimos, incapacita-nos de, muitas vezes, tomar rédeas da nossa vida, nos diferentes contextos. Todos sentimos que, numa determinada situação, quando há um grande desafio, mas que não temos meios de fazer face ao mesmo, nem apoios, ou seja, quando estamos num momento de crise, a luta diária leva-nos a uma sensação de exaustão. É assim no meu quotidiano, na minha profissão, no contacto com os outros, amigos, família, nas referências dadas pela comunicação social, que me apercebo que é esta a sensação geral: exaustão! A Saúde Mental em Portugal está pelas últimas! Poucas são as forças, muita é a necessidade de restaurá-las, mas diminutas são as perspetivas. Queira-se ou não, tudo está interligado, e se o país está em crise, a perturbação da nossa saúde mental, do nosso bem-estar psíquico, é ao mesmo tempo uma consequência dessa crise e um reflexo da mesma. Estamos esgotados. Nos bolsos, na alma, nas ideias, na mente. E esgotamento é inverso de produtividade. E se para os governantes, a atenção recaí no facto de as perturbações mentais resultarem em pessoas incapacitadas e daí consequências nefastas para a economia, ou seja, maior necessidade de tratamento, mais recursos gastos e menos produção ativa, para essas pessoas, para além de todas as dificuldades, o problema recai na sua incapacidade de viver. Todos os sentimentos, emoções negativas e consequências diretas para a saúde física e mental, nos seus relacionamentos pessoais e profissionais e na sua expetativa futura. Muitas pessoas não têm os apoios suficientes (e não falo só de questões económicas, embora estas não sejam de menor valor), nem os recursos internos para lidar com todos os desafios e sentimentos de desesperança, mergulhando muitas vezes em comportamentos ainda mais nefastos para a sua integridade física e psicológica e dos demais: comportamentos aditivos, desviantes, suicidários, etc.. E se assim é, mais questões se colocam àquele indivíduo, àquela família, a todos nós, sociedade. Um ciclo vicioso, portanto. Há que investir na quebra destes ciclos. Há que investir na promoção da saúde mental, na recuperação das pessoas mentalmente perturbadas, há que investir em todos nós, porque só assim investimos num país de futuro! Sem pessoas, não há nações, sem pessoas, não há economia, sem pessoas não há sociedade! E se os governantes já se aperceberam que a saúde mental é responsável pela incapacitação de pessoas ativas, com consequências adversas para os diferentes segmentos da economia, então há que investir nos recursos necessários para ajudar, primeiramente o ser humano em permanente sofrimento, de modo a minorar esse mesmo sofrimento e, em segundo lugar, promover mais e melhor saúde mental da população, para maior progresso do país.

Em Portugal não há ainda a aposta necessária neste setor. Nas notícias aumentam os relatos de suicídio, na população civil, na população reclusa, entre outros. O suicídio é um verdadeiro sinal de alerta, que não podemos ignorar. É o culminar, muitas vezes, de um sofrimento silencioso, que se arrasta no tempo. E toda a exaustão, aliada a um futuro incerto e negativo ajudará a estas estatísticas.

Ainda que a reestruturação dos serviços de saúde mental em Portugal esteja a ocorrer, o que temos para já é insuficiente. É dever do país permitir que todos os cidadãos tenham acesso a cuidados de saúde mental. Que estes recursos não se limitem apenas aos centros urbanos, deslocando muitos doentes psiquiátricos das suas localidades, fragilizando ainda mais os laços familiares. É urgente uma rede de cuidados de saúde mental mais alargada, com os devidos técnicos em atuação. Neste sentido, o Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 tem como objetivos fundamentais, os seguintes:

- Assegurar o acesso equitativo a cuidados de saúde mental de qualidade a todas as pessoas com problemas de saúde mental do país, sobretudo as que pertencem a grupos especialmente vulneráveis; Promover e proteger os direitos humanos das pessoas com problemas de saúde mental; Reduzir o impacto das perturbações mentais e contribuir para a promoção da saúde mental das populações; Promover a descentralização dos serviços de saúde mental, de modo a permitir a prestação de cuidados mais próximos das pessoas e a facilitar uma maior participação das comunidades, dos utentes e das suas famílias; Promover a integração dos cuidados de saúde mental no sistema geral de saúde, tanto a nível dos cuidados primários, como dos hospitais gerais e dos cuidados continuados, de modo a facilitar o acesso e a diminuir a institucionalização.

Para que se possa prosseguir na concretização destes objetivos é premente investir nos técnicos de saúde mental, na sua formação, assim como na disponibilização de lugares neste mercado. Tantos são os licenciados em Psicologia, por exemplo, que não têm qualquer colocação no mercado de trabalho, muito menos no sistema nacional de saúde, sendo vital usar estes recursos essenciais, contribuindo não só para a diminuição do desemprego na área, mas para melhorar as respostas ao nível da saúde mental.

Ter objetivos de promoção de maiores respostas e acesso dos cidadãos aos serviços de saúde mental, sem que haja abertura para a introdução do número de técnicos realmente necessários à execução desses objetivos, representa um grande perigo. A sobrecarga dos profissionais que já fazem parte do sistema, para além de não colmatar as reais necessidades, poderá implicar na saúde mental desses mesmos profissionais (que antes de técnicos, são também humanos), e cuja saúde mental é vital para que o serviço prestado seja de qualidade.

Na Saúde Mental, como em tantas outras áreas, há que fazer bem e pensado, para que a exaustão não seja também o cenário.

 

Cecília Pinto

 

16
Jul12

E agora damos a palavra a si, que nos lê.

Publicado por Mil Razões...

 

Queremos conhecer melhor os seus gostos e as suas expetativas, enquanto leitor do blogue Mil Razões… Para isso pedimos alguns minutos do seu tempo para responder às seguintes questões:

 

No blogue Mil Razões…, o que é que mais lhe agrada?

E o que é que lhe agrada menos?

O que gostaria de ver alterado?

O que gostaria de encontrar e que neste momento não encontra?

 

Por favor responda àquelas questões fazendo um comentário a este artigo.

Agradecemos o seu contributo!

 

Mil Razões…

 

13
Jul12

Este país não é para loucos (Saúde mental – 4)

Publicado por Mil Razões...

 

Há qualquer coisa de profundamente errado neste quadro: este país à beira-mar plantado, com excelentes condições climatéricas, gastronómicas e culturais, definha de dia para dia. Sente-se a aproximação silenciosa de uma espécie de nuvem negra, de um nevoeiro cada vez mais denso, mais enxofrado e fétido.

Temos tudo para termos tudo mas falta-nos tanta coisa. Temos brandos modos e modos de brandura que enervam. Temos gente boa e gente que, de tão boa que é, até enerva.

Temos bons pais, bons filhos, bons amigos, bons profissionais, bons… Temos tanta coisa boa… Mas isto não anda. Nem vejo jeitos de andar.

Enervam-me os putos malcriados que não querem nada da vida, nem deixam que outros queiram. Enervam-me os putos gordos que se deixam engordar sob o olhar parcimonioso e protetor dos pais.

Mas enerva-me mais saber que os putos são aquilo que os adultos deixam que eles sejam. E enerva-me mais ainda a ideia de que um dia esses putos serão os adultos que perpetuarão a má-criação e a engorda.

E nenhum brando modo trava isto.

É preciso uma boa dose de loucura para dar um murro na mesa. Seria um desrespeito pelos bons costumes deste país tão bem plantado à beira-mar.

Que nos vejam o rabo. Antes isso que dar um murro na mesa.

Antes parvo que louco.

Brandos modos é o "quero lá saber!" dos coitadinhos.

Depois logo se vê. Qualquer coisa surgirá. O que nos remete para o outro lado do "quero lá saber!": "o desenrasca".

Preparação para quê? Eu desenrasco-me.

Este país não é para loucos. É para gente boa. Para gente boa com o rabo à vista.

 

Joel Cunha

 

10
Jul12

Zona de conforto, o costume (Saúde mental – 3)

Publicado por Mil Razões...

 

Como está a saúde mental em Portugal? Bem, obrigado! Continuamos com as nossas festas cheias de vida, música, dança e petiscos. Continuamos com o nosso sol e a nossa chuva, que nos trazem tanta alegria. Continuamos com as nossas reclamações, não fossemos nós o povo português, cuja música que nos identifica é o fado, que só por si diz tudo. Continuamos assim na nossa zona de conforto, capazes de apreciar a vida, sentindo-nos bem connosco próprios em relação aos outros, mesmo que isso implique a falta de princípios e regras comunitárias.

Dizem alguns autores que o português é por natureza insatisfeito e procura sempre razões para se queixar. Ao tentar resolver as situações que podem pôr em causa a sua saúde mental, por vezes encontra contornos às soluções que poderiam gerar um bem comunitário e não apenas o seu próprio bem-estar momentâneo, sem olhar aos longos anos de vida que ainda lhe restam em sociedade. Lidamos assim com as situações de forma positiva, conseguindo ter sempre energias para festas e desfrutar delas. Mantemos a nossa saúde mental em bom estado pois temos sempre a procura incansável de equilíbrio entre o que fazemos e o esforço para o alcançar.

Quantas vezes já nos ouvimos dizer “Não posso admitir isto, não posso continuar assim porque senão dou cabo da minha saúde mental!”?

Temos até leis que defendem a saúde mental individual, que nos protegem aos olhos da justiça perante situações de que somos vítimas. Estas leis servem para assegurar que realmente a saúde mental comunitária se mantenha em bom estado. Mas ficar em bom estado para alguns indivíduos implica prejudicar a saúde de outros. Aí é que entra a zona de conforto individual como um obstáculo.

É nestas alturas de confronto de ideias e de formas de estar que o conflito começa. Quem está habituado a fazer sempre da mesma forma as mesmas coisas, não arriscando muito em fazer diferente para garantir que corre tudo bem, por vezes nem se apercebe que isso poderá ser prejudicial para ele próprio e para os que o rodeiam. Em Portugal preservamos muito as tradições, das quais nos devemos orgulhar. Mas preservá-las, em qualquer contexto, não deveria ser fechá-las ao mundo como inalteráveis. Isso é puro egoísmo, é medo de sair da zona de conforto.

Se continuarmos a fazer sempre o mesmo, chegará a um ponto em que nos cruzamos com pessoas diferentes que já viveram experiências diferentes e que até têm muito para dar, mas fechamo-nos a elas. Em vez de aceitarmos de bom agrado o que há de novo, fingimos que ouvimos para mostrar que estamos a ser culturalmente inclusivos.

Ora, penso que isto não é uma saúde mental em bom estado, pois os conflitos poderão surgir. Como o povo tradicionalmente diz, isso será “tapar o sol com a peneira”. Isso é puro cinismo, pois aceitamos as sugestões de outros, permitimos a sua entrada na nossa vida dizendo até que são bem-vindos, mas na realidade só estamos a tentar mostrar que somos indivíduos muito simpáticos e flexíveis.

Onde está a flexibilidade quando continuamos com os mesmos hábitos, mesmo depois de ouvir exemplos e conselhos diferentes do que estamos habituados?

Não, a flexibilidade acaba quando, no final da troca de opiniões e na aceitação de soluções diferentes dizemos “Vamos fazer como é costume. Talvez para o ano possamos mudar, mas por agora fazemos assim pois correrá tudo bem”.

Eu digo, e isto é apenas a minha opinião, o costume não ajuda em nada se se pensar nele como o mais certo, se tivermos medo de arriscar, errar e melhorar.

Mas para manter a saúde mental, continuamos em festa, que isso sabemos fazer bem e a nossa saúde mental agradece.

 

Sónia Abrantes (articulista convidada)

 

06
Jul12

O amigo comprimido (Saúde mental – 2)

Publicado por Mil Razões...

 

Dizia há dias uma colega enquanto tomávamos café:

- Que sacrifício! Estou com tanto sono que só com muito esforço a cabeça não me cai em cima do teclado. Não sei como vou aguentar até ao final do dia!

- E porque é que tens assim tanto sono?

- Não tomei o comprimido.

- O comprimido?! Observei timidamente receando que a minha ignorância ferisse a suscetibilidade da minha amiga. O artigo antes de “comprimido” define-o, torna-o único, deveria ser óbvio para mim, do que é que ela falava.

- Sim, o comprimido para dormir.

- E porque tomas comprimidos para dormir?

- Porque a minha médica os receitou.

- E desde quando é que a tua médica os receita?

- Desde que comecei a ter insónias e pesadelos, logo a seguir à morte do meu marido. Nessa altura tive muito medo que me acontecesse o mesmo, e temi pelo futuro dos meus filhos. Por outro lado, a tarefa de os educar sozinha não tem sido fácil, eles estão em idades complicadas e muito marcados pela morte do pai. Às vezes rebentam tempestades lá em casa e acalmá-los não é fácil.

- Falaste à médica sobre a morte do teu marido?

- Não foi preciso, ela sabe, por isso é que receitou os comprimidos.

- E não te encaminhou para um psicólogo, sei lá… para um psiquiatra?

- Ela não, mas quando tive aquele ataque de ansiedade aqui no emprego e me levaram ao hospital, o médico que me viu disse que eu deveria consultar um psiquiatra.

- E então?

- Achas que sim?! Achas que tenho dinheiro e que aqui o chefe me dispensava para andar nos psiquiatras? E os colegas não iriam pensar que eu estou mas é maluca? Conto a ti porque somos amigas, mas nem toda a gente vê com bons olhos as visitas ao psiquiatra.

- Então com quem confidências as tuas tristezas, os teus medos, as tuas ansiedades, a tua perda?

- E alguém quer saber dos meus problemas? As pessoas têm os seus próprios problemas e olha que algumas não têm poucos, então agora com esta crise...

- Mas voltando ao teu amigo comprimido, até quando é que a médica receitou o comprimido milagroso?

- Não disse até quando vou tomá-lo; receitou uma caixa e quando ela acaba volto lá e ela passa nova receita, eu até estou a pensar em mudar para os que me deram no hospital, achei-os mais eficazes, estes acho que já não me fazem grande coisa. 

- Isto é: és médica de ti própria.

- Se assim se pode dizer.

 

Li, depois desta conversa, um estudo sobre a saúde mental em Portugal no qual o investigador, concluía que a prevalência dos problemas mentais em Portugal é muito superior à de outros países da Europa. No topo dos problemas estão as perturbações de ansiedade – 16,5%, seguidas das perturbações depressivas – 7,9%, perseguidas pela incapacidade de controlar os impulsos – 3,5%, e as perturbações relacionadas com o álcool – 1,6%.

À minha amiga não lhe diagnosticaram qualquer perturbação mental, assim, não está incluída nestas percentagens. E quantos mais não terão ficado de fora? É caso para dizer que Portugal está doente e não sabe quanto.

 

Cidália Carvalho

 

03
Jul12

Não tem saúde mental, nem física (Saúde mental – 1)

Publicado por Mil Razões...

 

Difícil dizer um governo que não seja corrupto. Com tantos desvios de dinheiro a saúde paga por isso.

No Brasil existe o SUS, Sistema Único de Saúde. Na teoria todos nós brasileiros temos acesso a eles, uma rede de hospitais e postos de saúde.

Mas na prática isso não acontece. Faltam médicos, leitos, remédios, vagas, resumindo, falta tudo.

Um sistema que ignora, que não respeita os pacientes é um sistema falido.

Uma das lutas mais constantes é a Reforma Psiquiátrica, que batalha pela integração do paciente a sociedade e visa seu bem-estar, já que durante anos as pessoas viam os horrores que os pacientes sofriam internados em manicômios, onde eram tratados brutalmente e muitos não sobreviviam a tanta violência. Com o começo da reforma hospitais psiquiátricos foram fechados, existe sim a solução, mas apenas em teoria.

A saúde mental no Brasil foi como todas, abandonada. Os hospitais foram fechados, mas isso não garantiu bem-estar aos pacientes nem um lugar digno para poder fazer seu tratamento.

Ainda hoje no século 21, psiquiatras e ativistas da causa lutam arduamente para poder ajudar pessoas vítimas de distúrbios mentais, mas trabalham sem ajuda do governo, sem apoio.

Brasileiros como muitos passam dificuldades econômicas, vivem debaixo de uma pressão enorme, vendo seus direitos massacrados e sem ajuda de nenhum lado, tudo isso vira uma panela de pressão em qualquer mente.

E o governo ignora tudo isso. Acesso a psiquiatras apenas quem tem dinheiro para pagar pela consulta e pelos remédios. Quem quiser esperar na fila durante meses pode conseguir alguma consulta, mas isso não garante os remédios.

O que dizer de um país que leva seus cidadãos a loucura? Esse pouco caso que se faz da saúde mental mostra como o Brasil é um país devorado pela corrupção, pelo desvio de dinheiro, um país que ignora o sofrimento das pessoas e o calvário que pode ser uma doença mental quando não é tratada a tempo.

A pergunta é - Existe saúde mental no Brasil? Não. Ela é tratada como uma coisa sem importância, não está em nenhuma lista de prioridades, nem é considerada uma questão de urgência.

Dizem que o brasileiro tem fama de se automedicar, que são um povo hipocondríaco, mas não é verdade. É um povo que se arrisca a comprar os remédios sem receitas porque foi abandonado pelo sistema, não há médicos nem tratamentos disponíveis, então tenta salvar-se da melhor maneira possível. Não é ideal comprar remédios sem receita, mas como sobreviver em um país que não respeita os direitos das pessoas e nega a elas tratamento?

Cada um sabe de si e diante do silêncio do governo são todos obrigados a fazer o que puderem para viver mais um dia. Nem que seja o último.

 

Iara De Dupont (articulista convidada)


Porto | Portugal

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